Peculiaridades arquitectónicas de Liège

Num artigo anterior, referi que Liège tinha sido devastada várias vezes ao longo da sua História, a última delas durante a 2ª Guerra Mundial. Num dos próximos artigos irei falar sobre isso mas, para já, o que interessa é que com este passado atribulado, sobra hoje pouco das construções medievais da cidade.

No último fim-de-semana decidi ir esticar as pernas pelas ruas de Liège, à descoberta dos seus contrastes e particularidades. Comecei na Praça da Ópera e passei sucessivamente pela ilha de Outremeuse, bairro de Guillemins e regressei pelo centro histórico da cidade numa volta simpática de cerca de 9km.

Aquilo que foi perfeitamente perceptível é que a maioria das construções datam do século XVIII em diante, embora seja possível encontrar alguns exemplares mais antigos. Mas estas construções evidenciam bem o fulgor económico da cidade, a "Cidade Ardente" como é chamada, e o grande crescimento da mesma ao longo dos últimos 200 anos.

No entanto, entre inúmeros pormenores houve um que me chamou a atenção e que se encontra em praticamente todas construções do século XIX e início do século XX ou, pelo menos, nas menos modestas. Praticamente todas as construções deste período têm em comum as mesmas características e que se podem ver nas fotografias seguintes: uma abertura ao nível do solo, um respiradouro na escadaria de acesso à porta ou perto dela e um elemento que ao início me intrigou e que em geral consiste numa cavidade com um elemento metálico proeminente.





A abertura ao nível do solo servia para despejar carvão para aquecimento das casas, ou não se gabasse Liège de ser sede da região onde se descobriu pela primeira vez a hulha, ou carvão betuminoso, que possibilitou a Revolução Industrial. Os respiradouros estão associados à mesma cave para a qual o carvão era despejado e queimado e estarão certamente nesse local para permitir a entrada de oxigénio no compartimento.




Por último, o terceiro elemento remete para uma época em que as ruas estavam cheias de lama, inúmeras obras e testemunhavam um intenso tráfego de carros de tracção animal: trata-se dos "décrotteurs", literalmente os "tira-bostas".






Estes elementos encontravam-se não só à entrada das residências mas também dos edifícios públicos e permitiam a quem trouxesse as botas sujas com lama ou com o resultado do escape dos carros de tracção animal que ia ficando no chão. Claro que os mais ricos também podia simplesmente recorrer a um "décrotteur" como eram chamados os engraxadores, que não só engraxavam as botas como também removiam o que estava a mais nas solas.

Hoje em dia passam quase despercebidos sendo que a grande maioria já perdeu o seu elemento metálico e, pelo que pude perceber, muita gente desconhecce hoje o seu propósito original. No entanto são elementos arquitectónicos bastante interessantes que existem numa grande variedade de formas, mais ou menos normalizadas e que ainda hoje são capazes de dar bom jeito aos transeuntes que não costumam olhar para o chão que pisam.


















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